Crise no Governo de Sócrates
CAMPOS E CUNHA PEDIU PARA SAIR E VOLTA À DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA
Ao fim de 130 dias no Governo de José Sócrates, o ministro das Finanças Campos e Cunha pediu a demissão por «motivos pessoais» e por estar «cansado». Em declarações à TSF- Rádio Jornal, esta manhã, o ministro demissionário afirmou que pretende passar umas férias e que mais tarde vai voltar para retomar a cátedra na Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa.
A primeira demissão do Governo Sócrates será concretizada ao meio-dia, a hora agendada para o presidente da República empossar o novo responsável pela pasta das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, antigo secretário de Estado das Finanças e do Tesouro, nos Governos de António Guterres. São ainda desconhecidos os nomes dos futuros secretários de Estado. Teixeira dos Santos poderá, no entanto, conservar algum ou alguns dos homens de confiança de Campos e Cunha. Além do cansaço, o ministro das Finanças demissionário alegou «motivos pessoais e familiares». No dia 5 de Março, ainda antes de ter tomado posse como ministro, Campos e Cunha admite na TSF que o aumento de impostos era quase inevitável. «A subida dos impostos é uma possibilidade, a encarar não como primeira medida, mas se necessário for no médio prazo, o que é provavelmente quase inevitável», disse.Uma declaração que José Sócrates desmentiu de imediato. No debate do programa do Governo, o primeiro-ministro garantiu que a prioridade é conter a despesa e combater tanto a fraude como a evasão fiscal. A promessa não se cumpre e em Maio, Campos e Cunha anuncia o aumento da carga fiscal, a começar pela subida do IVA. Campos e Cunha diz que não brinca com os portuguesesDepois dos impostos a polémica da reforma. A 4 de Junho o ministro chama os jornalistas para garantir que é legal a acumulação do ordenado de ministro com a pensão de vice-governador do Banco de Portugal. O Governo prepara alterações à lei da reforma dos políticos. Campos e Cunha garante que nada tem a opor. «O Governo definiu alterações que visam alterar a situação actual, a elaboração da lei está a ser realizada com a minha própria participação, não é uma questão moral, mas de cumprimento da lei, que obriga a todos», disse. O ministro das Finanças fala em ataques pessoais para afirmar que não vai desistir. «Não admito portanto que se levantem questões morais sobre mim. A situação do país exige a contribuição de todos os portugueses. Os ataques pessoais não me impedirão de dar o meu contributo», acrescentou. Poucas semanas depois, Campos e Cunha é obrigado a reconhecer erros no Orçamento Rectificativo, mas considera que essas falhas não colocam em causa o essencial do documento. No início deste mês, José Sócrates garante na SIC que os impostos não vão voltar a subir. No dia seguinte, o ministro das Finanças esclarece que tudo depende. «Se o sucesso da consolidação orçamental, assim o permitisse daqui a uns anos poderíamos baixar impostos, mas devo dizer que infelizmente não penso que o sucesso esteja acima das nossas previsões e portanto no horizonte vejo com dificuldade baixar impostos, mas também não vejo necessidade de os aumentar», afirmou. Artigo Polémico mas verdadeiro O clima de desconforto agrava-se com o artigo de Campos e Cunha no último domingo no Público. O ministro das Finanças escreve que «nem todo o investimento público é necessariamente bom». Na terça-feira, o responsável diz no Parlamento que os projectos da OTA e do TGV ainda precisam de nova avaliação. Sob as críticas da oposição, Campos e Cunha adianta que é preciso seriedade quando se fala em determinados investimentos públicos. «Eu não brinco com os portugueses, posso fazer erros, cometer asneiras, porque tomo decisões», garantiu. Ontem de manhã também no Parlamento, o ministro das Obras Públicas, Mário Lino, garantiu que a decisão sobre o TGV e a OTA já está tomada. Uma contradição que pode ter sido a gota de água na decisão de Campos e Cunha abandonar o Executivo. As reacções da oposição Para o presidente do PSD, Marques Mendes, a demissão do ministro representa «um profundo abalo na credibilidade do Governo» e um «péssimo sinal» para os agentes económicos nacionais e estrangeiros. O líder do CDS-PP, Ribeiro e Castro, considera que a saída do ministro das Finanças «abala a estabilidade política» e «pode manchar a credibilidade externa do país». O Bloco de Esquerda diz que havia um mal-estar à volta de Campos e Cunha, enquanto o PCP considera que esta é a «primeira e significativa derrota» do Governo. O PCP salientou, em comunicado, que «mais do que a substituição deste ou daquele ministro é a política do governo que é preciso ver substituída». Para os comunistas, a substituição do ministro das Finanças «não só não disfarçará as erradas opções e orientações do actual governo como mais justifica que os trabalhadores e o povo português façam ouvir a sua voz e a sua luta de resistência». |