As antenas de Glória do Ribatejo receberam, durante décadas, as emissões da Rádio Europa Livre, sedeada em Munique. A retransmissão era depois assegurada para países como a Polónia, Hungria e Roménia. Na década de 60, as emissões chegaram a ser feitas em 17 línguas diferentes. Eis o breve retrato de um sítio onde se fez parte da história da Guerra Fria.
O isolamento da aldeia e as condições morfológicas dos terrenos (essencialmente planos) faziam de Glória do Ribatejo o local ideal para acolher a Sociedade Anónima de Rádio-Retransmissão. Além disso, estava suficientemente longe dos países visados e ficava apenas a 80 km de Lisboa. A ideia partiu dos americanos, após a II Grande Guerra, em 1951. Um estudo concluiu que Portugal era um bom ponto de partida para as emissões de propaganda anti-comunista.
Em Abril desse mesmo ano, Portugal e EUA celebraram o primeiro contrato. A construção do complexo iniciou-se de imediato e foi estabelecido um limite de frequência para as emissões. Em Julho, começaram as retransmissões, a partir de um transmissor móvel de 7,5 kw de potência, instalado num camião de campanha norte-americano (o lendário «Bárbara). A programação da Rádio Europa Livre era constituída por blocos noticiosos intercalados com música - sobretudo tradicional dos países de destino. Havia espaço para dar a palavra aos dissidentes políticos.
Alguns funcionários que trabalharam na RARET recordam hoje que algumas emissões tiveram tanto êxito (como foi o caso da emissão para a Polónia), que chegou mesmo a fazer-se programas de discos pedidos. As chamadas dos ouvintes para a estação de Munique eram garantidas por uma linha clandestina, instalada pelo pessoal da Europa Livre.Nos anos 60, os funcionários beneficiavam de um centro de saúde com dois médicos permanentes, uma escola primária e uma escola industrial. Mas havia ainda um bairro residencial para os trabalhadores que vinham de fora e até uma piscina privada, campos de jogos e bar.
Para a memória fica também o som estrondoso da sirete que assinalava as mudanças de turno e a hora de pausa para as refeições (e que podia ser ouvido em praticamente todas as freguesias do concelho). Com o fim da Guerra Fria, a RARET deixou de ter razão para existir. O projecto ficou ao abandono (oficialmente a partir de 1996), as antenas foram entretanto retiradas e os CTT ficaram com o direito de propriedade (após a saída da administração norte-americana).
Em 2004, estava previsto um plano de pormenor provisório, com equipamentos públicos, comércio, serviços e residencial. Pouco tempo depois, soube-se do interesse de um grupo de investidores em desenvolver um projecto turístico arrojado e virado para as elites. Nem os campos de golf estão esquecidos...
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